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Chocante, sensível e apaixonante, Pílulas azuis encanta, surpreende e ensina!

Escrito por PH

Untitled-1Publicada originalmente em 2001 pelas Éditions Atrabile, Pílulas azuis chega ao Brasil pela Editora Nemo, fazendo parte de seus últimos lançamentos em graphic novels. Essa incrível e surpreendente coleção inclui: O Muro, Aisha e Metamorfose Iraniana. Com formato menor do que o dos álbuns europeus em capa dura, já editados pela empresa mineira, estes volumes são absolutamente arrebatadores. Provando que tamanho não é documento, tocam em assuntos delicados, que afligem o mundo atual, como álcool, drogas e a forte oposição entre o Ocidente e o Oriente Muçulmano, fazendo o leitor refletir a respeito da vida e sobre sua imensa diversidade e complexidade.

Pílulas azuis não é diferente! Trata-se de uma obra autobiográfica do suíço Frederik Peeters, mesmo autor da consagrada série AÂMA. Desta vez, ele conta uma história linda, sensível e profundamente chocante para a grande maioria das pessoas, ainda bastante desinformada em relação a uma doença extremamente agressiva e que já matou uma boa parcela da humanidade.

Em sua trama, Peeters se interessa por Cati, uma jovem bem diferente das outras que ele já havia conhecido e mais velha do que ele. O romance não acontece rapidamente, já que leva um tempo para que os dois se engrenem. Depois de se esbarrarem em algumas oportunidades, ficam sem se ver por um tempo, até que o destino os reúne mais uma vez. Nesta época, a moça já tem um pequeno rebento e está se separando de seu antigo marido. Antes que as coisas fiquem mais sérias e íntimas entre eles, Caty é absolutamente honesta e revela que ela e seu filho tem o vírus da AIDS. A notícia é devastadora para Fred, mas por razões que só o coração entende, um amor espetacular começa a se desenvolver entre os dois, acompanhado por medo da morte, incômodos coquetéis virais, uso obrigatório de camisinha, visitas regulares a médicos e a hospitais e muito companheirismo e tolerância de ambas as partes. Nesse meio tempo, Peeters se aproxima do pequeno, que acaba virando uma espécie de filho para ele. Todo este conto de fábulas moderno e verdadeiro é enriquecido por fantasias do autor, nas quais ele divide todas as suas aflições com um extinto mamute.

Lendo Pílulas azuis, me veio a cabeça algo que aconteceu de fato comigo. Quando era mais jovem, ainda na faculdade, gostava de uma morena que nunca havia me dado bola. Anos depois, a encontrei em um centro espírita. Começamos a conversar e percebi que ela ainda se lembrava de mim. Antes que pudesse falar mais, esta bela mulher revelou que estava ali, em busca de tratamento, por ser soropositiva. Quase caí do cavalo! Como meu interesse por ela não havia desaparecido, marcamos alguns encontros, mas devido a um indescritível pavor automático de contaminação que se instalou em meu ser, nunca consegui me relacionar de fato com ela. Não houve intimidade entre nós! Em meio a desculpas esfarrapadas, dizendo que estava sem tempo, fui me afastando ao poucos, mas mantivemos contato por telefone. Sei que ela ficou triste por isso! Um belo dia, liguei para saber como estava. Sua avó atendeu o telefone e me disse que minha “amiga” havia falecido. Nunca mais esqueci este dia! Fico pensando, se contribuí para a degradação de seu frágil estado de saúde, já que me disseram que ela havia se apaixonado e que não parava mais de falar em mim. Talvez, tenha morrido de desgosto, em virtude de meu desaparecimento progressivo! Se tivesse tido a coragem de Peeters e encarado a relação, será que tudo teria sido diferente e não passaria a carregar esta culpa pelo resto de minha vida? Guardei este segredo comigo por anos. Revelo-o agora! Não haveria melhor oportunidade!

Recomendo esta excelente leitura a todos. Como se não bastasse todo o forte drama psicológico que encontramos nela, seu final é incrivelmente criativo e revelador, na forma de um epílogo inesperado! A HQ serve, entre outras coisas, para esclarecer que existe vida além da AIDS e que esta não é mais uma sentença de fim irremediável! Mais do que isso, esclarece que pessoas portadoras do vírus da AIDS não devem ser excluídas da sociedade e privadas do saudável contato com outras pessoas, seja este qual for.

O livro foi impresso em brochura, possui 208 páginas, formato de 17 x 24 cm e preço de R$ 39,90. Pílulas azuis ganhou o Polish Jury Prize no Festival de Quadrinhos Angoulême.

Por PH.

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Sobre o Autor

PH

É ex-locutor do TOP TV da Record e radialista. Também produz a série Caçador de Coleções e coleciona HQs europeias, nacionais e quadrinhos underground

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