Luciano Salles é um dos mais talentosos quadrinista brasileiros. Dono de um estilo único, o desenhista nasceu em 1975, no interior de São Paulo, e mora em Araraquara. Formado em Engenharia Civil e tendo trabalhado como bancário, passou dezoito anos nestas atividades, para então dedicar-se aos quadrinhos. Em 2012, lançou sua primeira HQzine, Luzcia, A Dona do Boteco.
Para a alegria de meus leitores e minha própria, consegui entrevistar o artista, por e-mail, enquanto se prepara para publicar mais um trabalho, depois de L’Amour: 12 oz. Com o objetivo de ilustrar o post, perguntei se Luciano poderia fazer uma arte que tivesse a ver com a temática franco-belga dos quadrinhos, paixão declarada do site tujaviu.com. Como ele já estava com este pensamento na cabeça, as coisas acabaram se encaixando perfeitamente.
Eu, PH, só posso a agradecer a Luciano por toda a atenção que me dedicou e dizer que o desenho ficou simplesmente irado! E não pensem que não reparei na meia do Tintin, onde o cachorro Milu aparece discretamente. Fantástico!
Abaixo, veja a ilustração que ele criou, inspirada no universo idealizado por Hergé, mostrando o Capitão Haddock e Tintin, além de suas respostas para as perguntas que formulei.
1 – Quando sentiu que tinha jeito para as HQs?
Sempre foi o que gostei mais como leitor. Fiz minha primeira HQ com 37 anos. Antes, percorri um longo caminho como engenheiro civil e trabalhando em uma grande instituição financeira. Mas sempre fã, colecionador e admirador destes artistas. Por um motivo de saúde grave, pedi demissão do meu emprego e senti que precisava produzir a minha história em quadrinhos. Foi assim que lancei a HQzine ‘Luzcia, a dona do Boteco’ em junho de 2012. Realmente, nunca foi precoce em nada e os quadrinhos demoraram todo esse período para aflorar.
2 – É mais ligado nos comics americanos ou na Nona Arte Europeia?
Já li muito quadrinhos norte-americanos e de lá, acabei migrando para algumas coisas europeias. Moebius foi o caminho que me mostrou o que também poderia ser feito. Hoje, confesso que leio muito mais publicações nacionais. É claro que quando sai alguma coisa legal, encadernada de alguma publicação norte-americana ou européia, e que tenho apreço, procuro comprar.
3 – Enxergo em seu traço algo de Seth Fisher e Geoff Darrow, devido ao grau de detalhes de seus desenhos. Confirma estas influências?
Não tem como você não olhar um desenho desses dois artistas e não ficar impressionado. Claro que admiro demais ambos, mas a minha influência direta nos desenhos sempre foi Moebius. E quando você é novo e tenta emular um traço como o do Moebius, é certo que seu desenho ficará horrível. Mas sempre admirei tanto, que meu traço foi tomando a forma que hoje trago nos meus desenhos. Agora, quanto a detalhes, confesso que hoje, seguro um pouco a mão no quesito detalhes.
4 – Existem outros desenhistas estrangeiros que te influenciaram?
Existem muitos que de uma forma ou de outra te influenciam. Como desenhista você observa linhas, texturas e tipos de arte final que encantam. Ou pela sutileza ou por um traço brusco. E desenhando muito, todos os dias, seu traço tende a se sobrepujar a todas as influência e seu desenho começa a tomar uma personalidade. Acho que é natural a todo desenhista isso. Ter um desespero para que seu traço seja icônico é algo que vai prejudicar no andamento das coisas. Acho que curtir cada desenho, sacar o que funciona e que o faz feliz, sentindo realizado com o trabalho, é o caminho para achar seu traço. Agora voltando a pergunta, acredito que o Frank Miller me instigou quando li Ronin.
5 – O que acha do momento atual dos quadrinhos no Brasil.
Com certeza, é o melhor momento e para essa pergunta poderia desenvolver linhas de raciocínio. As publicações autorais estão sendo lançadas como nunca. Algumas editoras, ainda em estado letárgico, estão percebendo o potencial dos quadrinhos. Novas e ousadas editoras como a MINO acreditam no mercado. Um régua não tão calibrada pode ser o Catarse. São tantos projetos que iniciaram sua captação de recurso neste abril/maio de 2015 que é uma lindeza. Sem contar o eventos como o FIQ, a CCXP, Gibicon, a FLiQ em Natal, a Bienal do Livro de Minas que em 2014 dedicou um lindo espaço para os quadrinhos e tive a honra de ser convidado para o evento.
6 – Gosta da Linha Clara, cujo maior representante é Hergé e seu famoso Tintin?
Sim, gosto muito. Não sou um especialista na história das HQ, mas sei que Hergé com sua intitulada Linha Clara revolucionou. Aquelas linhas grossas, quase um ‘infantil ao contrário’, no meu ponto de vista, trouxeram um minimalismo que até hoje é muito usado e sempre será.
7 – O excelente L’amour: 12 Oz data de 2014. Como estão os trabalhos para seu próximo quadrinho?
Estou finalizando as páginas de Limiar: Dark Matter, que é minha nova HQ e será lançada em outubro de 2015. A revista está toda encaminhada e pela minha vontade, será um álbum independente. As pessoas me perguntam se a HQ sairá pela editora MINO. A MINO é uma editora fantástica, com pessoas fantástica e de mente aberta como acredito ser o melhor para tudo. Entretanto, Limiar: Dark Matter precisa ser independente. Ela fecha um ciclo que se iniciou em 2013 com O Quarto Vivente. Não digo que é uma trilogia, mas acredito que as histórias se conversam. Apesar de nada em comum entre os enredos diretamente, quando acabei de escrever o roteiro do meu novo trabalho, percebi esse fato. Fiz de forma inconsciente um ciclo que se abriu e agora encontra sua outra ponta.
8 – Quais são os desenhistas nacionais de HQs que mais curte?
Que pergunta difícil. De supetão posso citar o Rafael Albuquerque, Greg Tocchini e o Rafael Grampá. Esses ai são os caras que olho e penso: “…velho, eu não desenho nada! Nada!” rs. Mas é impossível não citar o Lourenço Mutarelli (outra grande influência no meu trabalho), o Marcelo Braga, Gustavo Duarte, Camilo Solano, Amilcar Pinna, Roger Krux e poderia ficar lembrando de nomes que acho que adoro o traço. São tantos!
9 – Pensa em fazer carreira na Europa?
Deixo isso para o tempo. Procuro fazer o melhor que posso, da melhor forma possível e honesta comigo. Não forço nada, mas que não quer dizer que não anseie. Se acontecer, estarei bem preparado. Acredito ser assim que funcione o que chamam de sorte.
Parabéns pelo talento e criatividade,fiquei emocionada com a entrevista.