Quadrinhos

Exploramos o lado Ligne Claire de Zombie World: O Campeão dos Vermes, de Mike Mignola e Pat McEown

Escrito por PH

Um dia desses, estávamos relendo “Zombie World: O Campeão dos Vermes”, um ótimo quadrinho americano. A leitura acabou nos remetendo a um assunto que é recorrente neste blog. O tema é a Ligne Claire e o trabalho em questão, por incrível que pareça, é um digno exemplo deste segmento das HQs. Para quem não conhece, trata-se de um estilo de desenhar e pintar quadrinhos que tem origem em antigos autores franceses, como Pinchon, o criador de Bécassine, e Alain Saint Ogan, o pai dos personagens Zig e Puce. A Ligne Claire consiste em um tipo de grafismo que é caracterizado pelo uso de cores chapadas com pouco ou nenhum sombreamento e pela utilização de cenários extremamente detalhados e realistas, embora o traço de seus personagens seja extremamente simples. O belga Hergé, o idealizador de Tintin, é um de seus maiores representantes. Além de Hergé, podemos citar uma boa quantidade de artistas que tem este tipo de visual, em suas obras, entre eles: Edgar Pierre Jacobs, Daniel Torres, Yves Chaland, Ted Benoît, René Sterne, Chantal de Spiegeleer, Stanilslas, Bob de Moor, Serge Clerc, Floc’h, Jacques Martin, Theo van den Boogaard, Willy Vandersteen, Jooste Swarte e muitos outros. O grande detalhe é que todos os que mencionamos são franceses ou belgas e trabalham ou trabalharam em terras europeias, onde a Ligne Claire é bastante cultuada. É de se estranhar que venha da editora americana Dark Horse, um puro sangue deste gênero.

“Zombie World: O Campeão dos Vermes” (“Zombie World: Champion Of The Worms”), de 1998, foi publicado no Brasil, pela Editora Pixel, em 2007. Com 82 páginas, roteiro de Mike Mignola, o criador de Hellboy, desenhos de Pat McEown e cores de Pamela Rambo, o álbum pertence à uma linha de terror da Dark Horse. O desenhista Pat McEown nasceu no Canadá e não esconde o seu amor por artistas da Ligne Claire, como Hergé e Yves Chaland. O motivo de seu gosto talvez esteja no fato de seu país ter sido, em parte, colonizado por franceses, o que deixaria seus profissionais de histórias em quadrinhos, mais receptivos às influências europeias clássicas da banda desenhada. O próprio Mignola, no posfácio da edição, se disse surpreso com o que viu nas páginas de Zombie World, chamando o traço do colega, de “tintinesco”, em referência a Tintin.

A ideia de Zombie World surgiu de uma conversa de Mignola com seu editor, Scott Allie. O idealizador de Hellboy, apesar de ter feito o texto da aventura, entregou toda a parte de desenhos, com exceção da capa, a McEown. Foi este último que compôs os personagens, flertando, em alguns poucos momentos, com a forma de desenhar de Mignola. Tendo liberdade total para fazer o que quisesse, Pat McEown acabou com o clima sombrio da história, para dar lugar a um festival de cores e cenários rebuscados que tem muito mais a ver com a Ligne Claire de Hergé, do que com o look que Mignola imprime aos seus desenhos.

Zombie World narra os problemas causados pelo poderoso e morto feiticeiro hiperboreano, Azzul Ghota, cuja múmia volta à vida, após 42 mil anos de prisão, dentro de um velho sarcófaco. A criatura desperta no interior de um museu, onde ficou guardada por todo este tempo, causando muita destruição. Ela pretende sacrificar a humanidade, como oferenda para os seus antigos deuses-vermes. Para resolver a situação, é chamada uma equipe de investigadores paranormais, composta por quatro membros, entre eles: um deficiente visual que tem uma alma-gêmea em forma de espírito de mulher que brota de seu corpo como fumaça, uma heroína que mais parece ter saído das mãos do saudoso Yves Chaland, um brutamontes que lembra o jeitão de Hellboy e um senhor de idade com cachimbo na boca que funciona como uma espécie de líder do grupo. Os elementos de arqueologia presentes nesta trama tem tudo a ver com os que encontramos na saga de Blake e Mortimer, do belga Edgar Pierre Jacobs, um dos monstros sagrados da Ligne Claire.

Segundo Pat McEown, a composição visual do bruxo Azzul Ghotafoi inspirada em um vilão das aventuras de Asterix, ícone francês dos quadrinhos, criado por Albert Uderzo e René Goscinny. “Zombie World: Champion Of The Worms” é ou não é a edição mais Linha Clara, de todas as que a Dark Horse já publicou até hoje? Se alguém ainda tem alguma dúvida, é só dar uma olhada na foto que ilustra este artigo, extraída de uma das páginas da publicação. A imagem não é a cara de muito do que vemos em Tintin e em seus similares? Abaixo, mostramos a capa da revista, desenhada por Mike Mignola, fugindo completamente ao que há no interior do volume. 

Por PH.

Sobre o Autor

PH

É ex-locutor do TOP TV da Record e radialista. Também produz a série Caçador de Coleções e coleciona HQs europeias, nacionais e quadrinhos underground

Deixe seu comentário